quarta-feira, janeiro 26, 2005

Ah pois...

"José Mourinho é o melhor treinador do Mundo. Há pouco menos de um ano não era: rasgava camisolas, jogava feio e cada vez pior (onde iam os tempos em que vencia os grandes?), aceitava mal as derrotas, preparava-se para perder o campeonato que o Sporting viria a ganhar e a Liga dos Campeões estava arrumada, porque vinha aí o Manchester United. Parece impossível que alguma vez tenham sido escritas semelhantes coisas, mas a confirmação está ao alcance de qualquer um na biblioteca mais próxima. Onze meses depois, o treinador do Chelsea levou um banho de ouro e o passado entrou no chuveiro com ele para lhe esfregar as costas. Agora, estão ambos dourados. Então não havia problemas disciplinares escusados no tempo de Mourinho? O caso Simão, os sumaríssimos a McCarthy e Costinha, o vício dos amarelos que Deco nunca ultrapassou, a troca de agressões entre este último e Pepe, a bota arremessada a Paraty, as três suspensões a Mourinho "lui même", incluindo uma na Taça UEFA, a expulsão impensada de Jorge Costa na final da Taça e os castigos internos a Baía, Benni e César Peixoto nunca existiram? Como podem jornais e comentadores que chegaram a levar a sério a hipótese de irradiação de Deco e reclamaram a forca para os autores dos lapadões em Simão defender que nos bons tempos do melhor treinador do Mundo o FC Porto era um exército de robôs dirigidos à distância pelo banco? A verdade é que Mourinho nunca conseguiu controlar a falta de bom senso de alguns jogadores nem foi ele próprio um exemplo de auto-controlo. Com um ou outro treinador, é o FC Porto quem não parece capaz de pôr termo ao destempero que, disfarçado de competitividade, pôs em risco nestas últimas épocas mais do que o maxilar de alguns defesas centrais adversários ou o tom rosado das bochechas do Simão Sabrosa. Não é que o termo "reprovável", usado nos últimos oito dias uma cinquenta mil vezes para falar de McCarthy e Fabiano, seja o primeiro que me vem à ideia quando penso nas cotoveladas, porque reconheço que dentro do relvado a moralidade é outra, mas toda a gente sabe que a Comissão Disciplinar da Liga chamou a si, com uma ternura muito especial, a educação do FC Porto e dos seus jogadores. Esquecê-lo tantas vezes denuncia falta de inteligência."
JOSÉ MANUEL RIBEIRO, em "O Jogo"

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